© Coleção Equilíbrio em Duas Rodas (2021)
Livro: De Motoca na Estrada
Fábio Magnani
[publicado originalmente em dezembro de 2007]
O Guia 4 Rodas dizia que o trecho entre Juazeiro-BA e Senhor do Bonfim-BA (130 km) estava ruim. Estava bom, tranqüilo, bom asfalto. Então pensei: se este trecho que está marcado ruim está bom, então o resto vai ser mamão com mel.
Essa parte da viagem foi marcante por várias razões: estava indo em direção ao desconhecido sertão da Bahia, era a primeira divisa transposta naquela viagem, estava viajando sozinho no meio do Brasil e rodava no meio da impressionante transição entre a caatinga e o planalto do cerrado. A emoção por pilotar sozinho era quase incontrolável, indescritível. O relevo, então, era fantástico. Ao sair do Rio São Francisco tinha uma grande caatinga seca e plana. Ao longe era possível ver uma cadeia de montanhas. Pareciam tsunamis que vinham engolir a estrada.
Parei para perguntar o caminho em Senhor do Bonfim-BA. Os motoristas em uma borracharia disseram que o caminho normal era por Feira de Santana-BA. Olhando para o mapa dava para ver que seria uma volta muito grande. Tinha pensado em ir por Jacobina-BA, fugindo do tráfego. Foi um grande erro. De Senhor do Bonfim-BA até Wagner-BA são praticamente 300 km de buracos. Alguns trechos são bons, mas quase todo o caminho era muito cheio de panelas. Em algumas partes eu tive que andar dezenas de quilômetros a 10 km/h, desviando dos buracos com bordas cortantes. A suspensão da Falcon até aguentaria bem os 5cm da borda, mas fiquei com medo de cortar o pneu ou soltar algum parafuso. O suporte inferior da bolha quebrou depois de passar em tantos buracos. Ela não ia cair, mas ficava batendo o tempo todo. Prendi a parte inferior com a fita Scotch, resolvido. A maior parte da viagem foi feita em estradas desertas, sem tráfego algum. Como demorei muito para andar pelos buracos, fiz o último trecho entre Bonito-BA e Lençóis-BA (130 km) à noite, no maior breu, em uma estrada desertíssima. Não tinha escolha, pois não havia lugar para parar. Como a estrada estava bem melhor, então dava para andar mais rápido. Em uma das curvas, levei o maior susto do mundo ao ver duas imagens no meio da pista, parados. Eram fantasmas, obviamente. Acelerei com o coração na boca. Um pouco depois, mais fantasmas. Corri mais ainda. Daí percebi que havia uma pequena comunidade logo ali em frente, e as pessoas ficavam conversando no meio da pista, já que não havia movimento. Ufa!
Em nenhum trecho eu reclamei dos buracos ou da escuridão. Em todos os momentos me senti contente por ter superado cada um dos obstáculos da viagem. Acho que o segredo é nunca pensar muito longe na viagem, mas sim colocar objetivos próximos como chegar ao próximo entroncamento ou ao próximo ponto de abastecimento. Também não tirei muitas fotos. Fiquei um pouco receoso de parar sozinho na estrada. Além disso os buracos atraiam quase toda a minha atenção. Foi um ótimo dia. Começou com uma cantoria dentro do capacete ao passar pela ponte entre Petrolina e Juazeiro, e terminou com o sono dos justos na Chapada Diamantina.
Sexta-feira – 28/12/2007
Distância percorrida: 568 km
Trecho: Petrolina-PE a Lençóis-BA
Tempo de viagem: 10 horas