Livro: De Motoca na Estrada
Fábio Magnani
[publicado originalmente em agosto de 2009]
Uma das correntes do motociclismo é formada pelos motoclubes, que são grupos organizados de motociclistas, com regras, objetivos, uniforme e hierarquia. Esses motoclubes se reunem, de tempos em tempos, em grandes confraternizações que são chamadas de motoencontros. Tanto o mundo dos motoclubes quando dos motoencontros são quase totalmente desconhecidos por mim. Acho que passei por motoencontros umas 2 ou 3 vezes, no máximo.
No último final de semana (14 a 16.08.2009) tive a oportunidade de experimentar de uma forma mais forte esses encontros. Eu e o Wagner participamos do Capibaribe Motofest, em um stand no qual apresentamos a nossa viagem ao Atacama. O convite foi feito pelo Juvenal, um amigo nosso que organizou o evento.
Foram só bons momentos. Em primeiro lugar, havia 100 dias que eu não pegava estrada de moto. Isso porque tinha prometido para a Renata que ficaria mais tempo em casa nos primeiros meses depois do nascimento do nosso filho. A última viagem tinha sido para a Pedra da Boca-PB, no feriadão do primeiro de maio.
Outro ponto alto foi a cidade de Santa Cruz do Capibaribe-PE, que fica a 200 km de Recife. O principal fator da minha admiração pela cidade foi o orgulho que todos os moradores expressam por morar ali. Santa Cruz, junto com Toritama-PE e Caruaru-PE, forma um grande polo de confecção, que exporta roupas de qualidade para todo o país.
Será que podia ser melhor? Pegar a estrada, ir para uma cidade com pessoas felizes e ter a experiência dos motoencontros. Sim, claro que podia. Ficamos 40 horas falando da Viagem ao Atacama.
Tínhamos objetivos bem claros no nosso stand: motivar novos motociclistas, mostrando que até iniciantes como nós podem pegar a estrada, testar um espaço para a discussão de viagens nos motoencontros e divulgar o meu site. Como motivação, apresentamos viagens antigas que fizemos nos últimos dois anos, mostrando atrações do nosso país: Vale do Catimbau-PE, Parque Nacional das Sete Cidades-PI, Chapada Diamantina-BA, Serra da Capivara-PI, Serra da Canastra-MG, Nascente e Foz do Rio São Francisco, além de muitas outras. Levei também uma cópia do livro “A Grande Viagem” para mostrar um dos resultados de nossas viagens.
De forma a fomentar a discussão de viagens, levamos todo o material sobre a Viagem ao Atacama que está no site. O material era discutido com o uso de banners, pastas, mapas, guias e livros. Mas o que valia mesmo era a conversa. Distribuimos adesivos e check-lists para viagens.
Conhecemos muita gente especial. Vários motociclistas que já tinham ido ao Atacama, um casal que pretende ir ao Chile no ano que vem e até um ciclista – de lá mesmo de Santa Cruz – que já tinha andado por toda a América do Sul. Vimos vários acessórios legais, como um tubo de PVC porta-câmara e um lubrificador manual de correntes. Outra sugestão foi de entrarmos por Uruguaina, ao invés de Foz do Iguaçu.
Fomos convidados a participar de uma entrevista que talvez vá para a televisão na próxima semana. Ficamos muito orgulhosos com as pessoas que pediam para tirar fotos conosco. O difícil era só ser chamado de tio: “Tio, você pode tirar uma foto com a gente?”. É a idade chegando…
No meio das conversas, conseguimos consolidar o nosso real interesse por patrocínio. É claro que não vamos recusar ajuda de custo. Mas o foco seria em ajuda para produção e divulgação do material da viagem: vídeo, livro e site. Achamos que temos diferenciais em nossa viagem: um ponto de vista de iniciantes, boa pesquisa prévia dos lugares a serem visitados, planejamento e registro da viagem. Nada de grandes pilotagens como no Rally dos Sertões. Mas por outro lado uma visão amadora, bem próxima aos consumidores de várias marcas e serviços. Nossa viagem, acreditamos, pode ser vendida não como um sonho impossível, mas como um sonho acessível a qualquer um que queira.
O motoencontro foi um show a parte. Como estávamos bem próximos dos organizadores, pudemos ver vários detalhes de perto. O trabalho foi grande, mas a recompensa valeu a pena. Um monte de amigos celebrando o que mais gostam na vida. Gente bonita, motos de todos os tipos e rock’n’roll. Fora as atrações, como o show de manobras.
Não sei quanto aos outros, mas esse motoencontro teve dois ambientes. O local onde ficavam os stands, no centro da cidade, onde iam todos à noite; e o local para o café-da-manhã e churrasco, usado durante o dia. Durante o dia ficamos no espaço de alimentação, conversando com os motociclistas experientes. Já à noite, no nosso stand, recebemos a visita de amigos e apresentamos nosso projeto para o público.
O Denny, companheiro constante de viagens pelo nordeste, foi lá especialmente para nos prestigiar. Além da amizade, deu um monte de sugestões para patrocínio, explicou o funcionamento dos motoencontros e motoclubes, azeitou contatos e ainda fez companhia na pizza da madrugada. Praticamente nosso manager!
Levei a moto carregada para o encontro. Queria testar o peso com as ferramentas e a ergonomia das bolsas de tanque e de banco. Ao contrário do que eu esperava, a bolsa de tanque não incomoda em nada. Já a de banco provocou danos. Aparentemente a viagem tinha sido confortável, porque eu podia descansar as costas na bolsa. Mas ao chegar em casa comecei a sentir dor no períneo. Acho que isso foi porque não conseguia mudar muito de posição, então todos os impactos se davam no mesmo lugar. Ainda não sei se a solução é mudar o banco para um erê ou se trocar a bolsa para uma mais estreita, que me permita mudar o ponto de apoio de tempos em tempos.
O GPS funcionou perfeitamente durante a viagem. A Canon SX110, conforme esperado, tem boa qualidade com iluminação, mas não produz boas fotos à noite sem o tripé.
Durante a viagem andamos devagar porque a moto do Wagner estava amaciando o motor. Em um determinado momento, ele começou a andar devagar. Eu parei para perguntar porque ele estava andando naquela velocidade. Mas ao fazer isso, gritei por trás do capacete. Eu só queria saber se havia algum problema, mas ele achou que eu estava reclamando. Tudo foi logo esclarecido, mas são esses pequenos detalhes de convivência que devem ser polidos para que consigamos viajar tranquilamente nos 44 dias previstos para o Atacama. Acho que o caminho é esse mesmo: qualquer mal entendido deve ser resolvido na hora. Eu tenho o costume de viajar sozinho, por isso, como eu sempre escrevo por aqui, o grande desafio é fazer essa viagem em grupo. Quando digo desafio, não quero dizer que viajar em grupo seja uma coisa ruim. Mas tenho consciência de que é uma dificuldade para mim. Também sei que uma vez vencida terei uma grande recompensa.
Ao contrário da ida – onde o foco era a apresentação no stand -, a volta foi muito relaxada. Os 200km passaram sem maiores preocupações. Chegamos em Recife no domingo, ainda a tempo de almoçar com nossas famílias.
18.08.2009